domingo, 16 de setembro de 2007

A universidade e a inovação tecnológica – ou o que a universidade tem a ver com isso?

A inovação ocorre na empresa, tudo bem, mas para ser mais, digamos...abrangente, ocorre como fato social. Por definição, a inovação ocorre no momento em que o novo é, de alguma forma, socialmente apropriado. Bem, aí nessa curta e imprecisa explicação encontram-se duas dicas importantes: primeiro, trata-se de algo novo; segundo, algo novo que tenha, por certos meios, sido incorporado à rotina de indivíduos e/ou coletivos, pessoas físicas e/ou jurídicas, ou como se queira nomear pessoas e instituições.
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A força que o conhecimento hoje tem sobre os valores e a organização das sociedades é muito maior do que sempre foi. Tudo o que as tecnologias de informação trouxeram e ainda estão trazendo para as sociedades contemporâneas impuseram forma, ritmo e conteúdo inovadores. Manoel Castells acredita que o que diferencia o atual momento dos demais na história é que, “pela primeira vez, a mente humana se torna força direta de produção e não apenas um elemento decisivo dos sistemas produtivos”.Mas isto é bom ou ruim para nós, países menos desenvolvidos? Bom, claro, pois que está na capacitação e na criatividade o principal diferencial dessa sociedade da informação. Ruim, claro, porque muitos não têm sequer o ensino fundamental completo. Assim mesmo, ao mesmo tempo bom e ruim, em um País de contrastes absurdos.Prefiro, particularmente, achar extraordinariamente positiva essa nova revolução tecnológica (que, creio, os historiadores não mais chamarão de industrial, simplesmente porque a indústria não é mais o principal diferencial, como o foi no final do século 18 e no final do século 19). Os requisitos de capital mudam sensivelmente, ganhando grande espaço o intelectual (não o homo intelectual, mas o capital, a força de transformação de coisas em valor).
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Vale aqui sustentar uma proposição básica: a de que é um erro de conseqüências imprevisíveis para um país separar a política e a estratégia de desenvolvimento científico e tecnológico da política de busca por inovações.Fazer inovação não se restringe a fomentar pesquisa e desenvolvimento, é preciso considerar o conjunto das atividades necessárias para que a inovação aconteça.
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Se às instituições acadêmicas não lhes cabe trabalhar para o mercado (exceto o mercado de trabalho), tampouco lhes é dado o direito de ignorá-lo. Aceitas essas considerações, podemos então tratar o tema sem medo de considerar a política baseada na inovação como algo que despreza demandas sociais outras que não as de natureza estritamente privada, de reprodução do status quo, ou como algo que não se ocupa da produção de conhecimento científico fundamental (a pesquisa básica). Tudo depende das diretrizes dessa política! Vejamos três argumentos nessa direção:
a) Pode-se perfeitamente pensar em ações de inovação voltadas a condições sócio-econômicas específicas. Gerar renda e promover qualidade de vida para populações excluídas requer inovação. Uma comunidade pobre que explora recursos naturais na Amazônia, por exemplo, carece de tecnologias de toda ordem (produto, processo, organizacional e de serviços), além de acesso a mercados com suas regras cada vez mais restritivas.
b) Um projeto de inovação tecnológica, muitas vezes, incita a investigação científica original, criando linhas de pesquisa variadas e combinadas – como por exemplo o conhecimento e a exploração da biodiversidade.
c) A política baseada no trinômio C,T&I requer o apoio a todos seus componentes, caso contrário não será uma política de C,T&I, mas qualquer outra coisa.Mas o que é que a universidade tem a ver com tudo isso? Bem, ela é parte indissociável de qualquer sistema C,T&I, seja pela capacitação de pessoal de alto nível, seja pela produção de conhecimento original ou adaptado, seja ainda pela capacidade que tem em pensar criticamente o futuro.

Que ela faz parte de um sistema de ensino e pesquisa (pelo menos as que fazem as duas coisas), isto já se sabe, mas é preciso também saber que ela é parte essencial de um sistema de inovação. Ignorar este fato é o mesmo que desperdiçar oportunidades e, pior, desperdiçar recursos públicos (no caso de universidades públicas). A universidade deve se abrir cada vez mais para atender e promover demandas públicas e privadas, sempre que houver um benefício social claramente sinalizado.Em tempo e antes que me crucifiquem: o cálculo do benefício social decorrente do investimento público não guarda relação direta e unívoca com as formas jurídicas pública ou privada. Pode-se ter elevado benefício social em investimentos privados e uma verdadeira calamidade pública em investimentos públicos, e vice-versa.

SÉRGIO SALLES FILHOJornal da UnicampEdição 227 - de 1º a 7 setembro de 2003
Fonte: http://www.ige.unicamp.br/geopi/noticias.php?id=26&desc=ok

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